Olavo Bilac - Antologia

25/10/2011 07:37

 

XIII

 

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,

Que, para ouvi-las, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto...

 

E conversamos toda a noite, enquanto

A via láctea, como um pálio aberto,

Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,

Inda as procuro pelo céu deserto.

 

Direis agora: "Tresloucado amigo!

Que conversas com elas? Que sentido

Tem o que dizem, quando estão contigo?"

 

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas."

 

 

Penetrália

 

Falei tanto de amor!... de galanteio,

Vaidade e brinco, passatempo e graça,

Ou desejo fugaz, que brilha e passa

No relâmpago breve com que veio...

 

O verdadeiro amor, honra ou desgraça,

Gozo ou suplício, no íntimo fechei-o:

Nunca o entreguei ao publico recreio,

Nunca o expus indiscreto ao sol da praça.

 

Não proclamei os nomes, que, baixinho,

Rezava... E ainda hoje, tímido, mergulho

Em funda sombra o meu melhor carinho.

 

Quando amo, amo e deliro sem barulho;

E, quando sofro, calo-me, e definho

Na ventura infeliz do meu orgulho.

 

 

Nel mezzo del camim...

 


Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada


E triste, e triste e fatigado eu vinha.


Tinhas a alma de sonhos povoada,


E alma de sonhos povoada eu tinha...



 

E paramos de súbito na estrada


Da vida: longos anos, presa à minha


A tua mão, a vista deslumbrada


Tive da luz que teu olhar continha.



 

Hoje segues de novo... Na partida


Nem o pranto os teus olhos umedece,


Nem te comove a dor da despedida.



 

E eu, solitário, volto a face, e tremo,


Vendo o teu vulto que desaparece


Na extrema curva do caminho extremo.

 

Palavras

 

As palavras do amor expiram como os versos, 


Com que adoço a amargura e embalo o pensamento: 


Vagos clarões, vapor de perfumes dispersos, 


Vidas que não têm vida, existências que invento; 


 

Esplendor cedo morto, ânsia breve, universos 


De pó, que o sopro espalha ao torvelim do vento, 


Raios de sol, no oceano entre as águas imersos 


-As palavras da fé vivem num só momento...

 

Mas as palavras más, as do ódio e do despeito, 


O "não!" que desengana, o "nunca!" que alucina, 


E as do aleive, em baldões, e as da mofa, em risadas,

 

Abrasam-nos o ouvido e entram-nos pelo peito: 


Ficam no coração, numa inércia assassina, 


Imóveis e imortais, como pedras geladas.

 

 

 

XXXI



 

Longe de ti, se escuto, porventura,


Teu nome, que uma boca indiferente


Entre outros nomes de mulher murmura,


Sobe-me o pranto aos olhos, de repente...



 

Tal aquele, que, mísero, a tortura


Sofre de amargo exílio, e tristemente


A linguagem natal, maviosa e pura,


Ouve falada por estranha gente...



 

Porque teu nome é para mim o nome


De uma pátria distante e idolatrada,


Cuja saudade ardente me consome:



 

E ouvi-lo é ver a eterna primavera


E a eterna luz da terra abençoada,


Onde, entre flores, teu amor me espera